sexta-feira, maio 26, 2006

Compaixão na ordem do dia?



Compaixão, empatia e altruísmo parecem não fazer parte, mesmo que minimamente, da personalidade de cada um em um círculo social. A cabeça e o coração não buscam, nem vibram nessa sintonia. Tais sentimentos também não fazem parte da seleção natural veiculada sobre o cunho de “normal” pelo senso comum. A pressão de seletividade se resume à busca incessante de um ideal representado por uma imagem bela, exuberante, eficiente e dotada de posses que o colocam numa espécie de zona sociabilizável. A alma ou psique está bloqueada, egocêntrica e vazia, especialmente, de compaixão. Assim, não é difícil se sentir só e descrente do exercício de virtudes. Estabelece-se um grande efeito dominó em que ação e reação se confundem e as pessoas sentem-se cada vez mais justificadas e legitimadas para adotarem uma postura centrada apenas em si. E aí, não se sabe mais onde começa a máscara social e onde termina o próprio eu.
O que fazer quando você se esforça para buscar certas virtudes e ao mesmo tempo sofre e é afetado pelas posturas que representam o que você não faria com o outro, muito menos com alguém próximo? Hamlet fez a mesma pergunta: “Ser ou não ser - eis a questão. Será mais nobre sofrer na alma Pedradas e flechadas do destino feroz Ou pegar em armas contra o mar de angústias - E, combatendo-o, dar-lhe fim? (...)”. Espinoza, também. Pensador das relações, definiria os seres pela capacidade de afetar e serem afetados por outros. Um bom encontro fortalece a minha natureza e aumenta minha potência de ação. Um mau encontro é, ao contrário, aquele que em um corpo ou uma idéia não se compõe com meu corpo e com minhas idéias, deixando-me, por isso, mais fraco. Resumidamente, a ética de Espinoza é resolvida rompendo o maquinalismo de “bem” e “mal”, para refletir o que é “bom” ou “mau” para determinado ser. Para isso, segundo Espinoza, fazer relações que se assemelham a nossa natureza é a grande meta, nossa liberdade dependerá disso, desvalorizando as aparências, o moralismo e as paixões tristes (decorrentes dos maus encontros, que tiram nossa potência de ação).
Como conciliar tantas exigências, tantas sombras (forças que agem no inconsciente), tantas pressões, tantas personas (máscaras sociais) e ainda manter a individualidade sem ser individualista?
Cada um com seu caminho conduz para um fim. Talvez, com compaixão - que nos permite ceder energia em benefício de outro - o caminho se torne mais agradável e quem sabe, mais curto.